Enfoque

Alvoroço na rua. Alguém corre casa adentro, pega o telefone e disca:
– Pronto
– Alô. Anota aí, depressa, O papagaio esta preso no poste.
– Minha senhora, deve ser algum engano, aqui é o setor de informações do Instituto Previdenciário.
Desocupa a linha e disca novamente:
– Centrais Elétricas bom dia.
– Aqui é a rua dos Anzóis, sessen e seis. Por favor, mande alguém depressa, o Papagaio está preso no poste…
– Dona Rua, explique-se melhor.
– Meu nome não é Rua e não sou dona. O coitado do papagaio está desesperado, ele subiu no poste e ficou lá em cima.
– O que podemos fazer, senhorita? Seu papagaio não sabe voar?
– Pelo amor de Deus. Papagaio é só o nome dele. Mande alguém para salvar meu macaquinho
– Como foi isto?
– Ele fugiu do alpendre e subiu no poste com corda e tudo. Agora está lá gritando.
– Por favor, repita o endereço.
– Rua…
– Aguarde.
Próximo ao local, um ônibus pára e pessoas descem veículo afora. O motor indica reinício da viagem, uma voz soa:
– Vai cair mais um.
– Caiu vovô.
A gozação vem de algumas moças que, em estado de graça, talvez por culpa do macaco, deixam aparecer os sintomas. O brasileiro vovô envermelh-se de qualauer coisa. Fixa encaradamente o olhar nelas, olha para o céu, tira o chapéu, volta à sua cor normal, agradece, coisa que ninguém entende, vai embora.
Rapidíssimo encostam o carro verde e branco, o rapaz também motorista, salta e vem dizendo:
– Isto é sério senhorese e senhoras, não deixam o bicho ver nenhuma banana.
Para cada lado da rua segue uma pesoa com o recado:
– É proibido passar bananas.
Papagaio continua desnorteado, já subiu o máximo, está no tôpo, bem distante das pessoas e parece subir mais, mas o poste é da altura de um só. A multidão se apresenta ao mesmo tempo ansiosa e alegre. O funcionário começa e vai subindo devagar.
– Cuidado com as bananas. Diz algum cidadão humorado.
– Uaaau… Uiii. Miserável. Ele me mordeu.
– Papagaio querido, ele quer te salvar. O moço ele é bom, ele…
Cala-se a moça, lembrando que Papagaio não a entende. De volta ao chão, com o dedo ensanguentado, o rapaz chega próximo à dona do bicho:
– Ele é vacinado?
– Não sei,eu trouxe ele anteontem.
– Então… Sinto muito, e… dane-se com seu macaco.
– O senhor não pode deixar ele lá, eu quero meu Papagaio, eu quero!
– Calma, eu dou um jeito – tranquiliza outro rapaz, que segue acrescentando:
– Macacos não mordam, mas banana é banana.
– Banana não, banana não.
– Ora, o instinto faz o bicho ficar mais forte. Quem tem uma bana? Só uma, gente!
Não se sabe como, mas no quarteirão onde as bananas eram proibidas, elas vão aprarecendo:
– Verde serve?
– Não sei. Pergunte para ele – e aponta mais para o poste do que para Papagaio que, à distância, permanece teimando em utrapassar o fim do poste.
– Ele gosta é assada.
– Fogo feito, banana nele.
O cheiro levado pelo vento faz do macaco um doido. O bicho, agitado, ensaia dexcer, mas, enraivecido, permanece retido pela corda.
– Asse a caturra.
Fito assim, o bicho não resiste e salta, mas não chega ao chão.
– Assassinos. Assassinos.
– Mas, moça, nós so assamos babanas…
– olha.
Estatualizada, chorando, a dona sem macaco aponta para Papagaio que, pendurado ao poste pela corda, ainda balança, balança… e cai entre a multidão. Há quem ache vergonhoso correr por isto, mas corre. Ninguém fica, nem os gritos das crianças e mulheres, nem as risadas dos desajeitados, nem as bananas que desaparecem, possivelmente levadas pelo Papagaio que também correu.

Deoclides Guimarães filho